O Pastor: O Mercado (9)

O Pastor estava no mercado de Inverness, mercado somente de produtores, um local para comprar diretamente ao agricultor. É aqui que ele fazia o seu dinheiro, a vender lã e leite de ovelha.

Trouxe toda a lã da época, de muito boa qualidade, muito graças a Bardolph – o grande Bardolph! Teve ajuda no transporte, claro, pediu ajuda a Steve, o dono da quinta ao lado. Depois pago-lhe uma jantarada!

O Pastor estava junto dum monte de lã enorme, tirou a sua boina e colocou-a debaixo da sua axila. Tirou do bolso um pequeno pente e penteou o já impecável cabelo. Penteou cuidadosamente para a esquerda e depois, mais uma vez a partir da linha reta, para a direita. Colocou o pente no bolso de peito do casaco e voltou a pousar a boina na cabeça, inicialmente de forma leve e depois é que a encaixou completamente. Se lhe perguntássemos do que se tratava tudo isto ele diria algo do género: Não é por ser um pastor que tenho que estar despenteado. E realmente percebo o ponto dele, embora não me seja tão relevante o arranjo do meu cabelo, principalmente por motivos de alopecia.

O movimento no mercado ainda era pobre, só os vendedores é que madrugavam como deve ser, os compradores só vinham depois das 9. O Pastor comia uma sandes, a segunda do dia que já ia algo longo, quando chegou um senhor deveras bem vestido: “Bom dia! É o senhor que é o Sr. Archibald?” O elevado cuidado com o cabelo não se fazia sentir em muitos mais aspetos estéticos do Pastor, com um pouco de molho junto ao lábio respondeu ao engravatado e finório senhor: “Quem pergunta?”

O senhor percebeu que a pouco simpática resposta inquisitiva era na realidade um sim. “Sr. Archibald, ouvi falar muito bem da sua lã e achei que poderíamos fazer negócio. Que me diz?” A ideia de aparentar um simplório era relevante por diversas razões por isso assim continuou: “O que é que acha que estou aqui a fazer?”

“Bem observado!” O toque do senhor era claramente impecável e estava ali para fazer negócios, a rudeza do Pastor não o afastava nem um pouco. O pastor Archibald tinha encontrado na sua existência muito pouca gente que demonstrasse tanto autocontrolo e emanasse tanta inteligência. O modo de ação do Pastor estava em potência máxima! A última vez que assim tinha sido tinham morrido duas pessoas, ou mais na realidade, uma. Tinha que tomar em conta todos os detalhes do que é uma pessoa, tanto relativamente a este claramente não escocês senhor, como na pessoa que Archibald é.

No seu típico e lento sotaque escocês: “Não é destes lados pois não?”

O senhor respondeu, com um enorme sorriso: “Estou a ver que o meu sotaque escocês não é muito bom…não como o seu!” O quê? Que merda é esta, estou a ser colocado em dúvida ou acabou de dar como certo que não sou escocês?... Versão mais simples, uma piada. O Pastor respondeu: “Não é muito bom, soa a francês.”

O senhor voltou a mostrar os dentes: “Exato Sr. Archibald, sou parisiense e ando numa missão!” Fez uma pausa, desconfortável para o Pastor pois depois de estar em modo de ação qualquer coisa que sucede tem que ser esmiuçada intensamente e em enorme detalhe. O francês, ou pelo menos, o homem que se fazia passar por um francês a tentar um sotaque escocês em Inverness (Esta história é rebuscada), tinha um pequeno tique no olho direito – piscava-o com maior força quando sorria. No fim da pausa quem falou foi o francês: “O meu nome é Louis Girard, trabalho para uma grande designer de moda que está à procura de lã de elevada qualidade para a linha do próximo inverno. Por isso é que vim aqui, ouvi muito sobre si…! Coisas boas, não se preocupe...!” Com isto, o que ele considerou ou aparentemente considerou como piada, riu-se imenso. Lá está outra vez o tique!

“Bem…” disse o Pastor, queria desarmar a situação agora e para isso, que tal vender a lã? “A minha lã é a melhor que encontrará por estes lados, não sei o que se anda a comprar por esse mundo fora, mas em Inverness quem vende a melhor lã sou eu.”

O francês parara de se rir da sua piada sem piada para ouvir Archibald, mudara para o tom do Pastor, sério e de negócios. “Quanto, meu caro Sr. Archibald?”

Ah! Falas a verdade…

Anterior
Anterior

Hoje não me calo

Próximo
Próximo

Era para aviar uma prescrição de ópio, se faz favor.